O vinho português Buçaco: quanto mais velho sempre melhor
A questão: abrir a garrafa e esperar uma ou duas horas melhora o vinho? Sim, ele ganha muito com isso, a aeração de suas moléculas libera os aromas e torna o sabor mais agradável. Isso é bem evidente com os tintos encorpados de safras recentes, que se tornam menos ásperos, ou menos tânicos. Suas garrafas devem ser desarrolhadas de 2 a 4 horas antes de serem servidos, com um pano ou guardanapo limpos em cima do gargalo para evitar a entrada de mosquitos alcoólatras…
Os tintos mais comuns e baratos também dão uma melhoradinha se abertos uma hora antes, tempo que também ajuda os brancos encorpados que passaram por estágio em madeira, tipo Chardonnay. Agora, se você não quiser esperar, despeje o vinho em um decanter e agite-o um pouco. Nada disso – tempo e decantação – vale para os espumantes em geral, por motivos óbvios: as bolhinhas irão alegremente para o espaço.
Quanto aos tintos mais antigos a história é outra, sendo bom passá-los para um decanter, filtrando a borra e eventuais pedacinhos da rolha. E não se deve esperar muito para levá-los às taças – se a lufada de ar faz bem aos jovens, podem levar os muito velhos para o vinagre em alguns minutos.
Mignardises do Couvent des Minimes, Provence, França
Muita gente considera frescura o ato de cheirar o vinho. Numa degustação dos vinhos portugueses Buçaco percebi que o representante da vinícola, António Rocha, não fazia comentários sobre as características de cada safra enquanto eu e os demais à mesa trocávamos opiniões sobre as nuances daquelas maravilhas engarrafadas, ainda mais desafiadoras à medida que os rótulos retroagiam ao século passado. Para ele, tudo se resume a uma questão simples: “Vinho tem de cheirar a vinho”.
É verdade, ninguém é obrigado a decifrar os aromas que a bebida apresenta. Mas também é verdade que eles estão lá, na garrafa recém-aberta e nas taças, independente de serem cheirados a fundo ou não. Mas não custa nada dar uma cheiradinha, pelo simples fato de que ela pode revelar, de imediato, se o vinho está estragado ou não. São famosos os odores desagradáveis de mofo provocados por fungos na rolhas, que passam para o líquido, ou de vinagre, quando o vinho oxidou. Antes de mofar ou avinagrar a boca não seria interessante enfiar o nariz na taça?
E por que não aproveitar a grande vantagem oferecida por nosso olfato para esticar o prazer dessa intrigante bebida? Ele é bem mais versátil do que pensávamos. Há muito tempo os cientistas sustentam que somos capazes de identificar entre 10 mil e 25 mil odores diferentes, o que já seria espantoso. Mas a especialista em olfação Leslie Vosshall, da Universidade Rockfeller, de Nova York, começou a duvidar desses números ao considerar que, se o ouvido distingue cerca de 340 mil sons e os olhos, 10 milhões de cores com apenas três receptores de luz, por que o nariz só reconheceria esses poucos milhares de cheiros se dispõe de 400 sensores olfativos?
Suas pesquisas levaram à seguinte reflexão: “Nossos ancestrais usavam bem mais o olfato. No mundo moderno, a refrigeração e a higiene corporal limitaram os odores, o que explicaria nossa atitude segundo a qual o olfato não é tão importante quando a audição ou a visão”. E passando da teoria à prática, chegou à conclusão, baseada em suas longas pesquisas envolvendo a cavidade nasal humana, que somos capazes de reconhecer perto de um bilhão de odores. Uma bela perspectiva para quem deseja ampliar os sentidos da degustação, não só de vinhos e outras bebidas, mas também da comida. Além do prazer imediato, podemos acionar mais tarde nossa poderosa memória olfativa para lembranças que nos fizeram bem. Não é bom?